Friday, August 10, 2007

Valores e desafios

Ontem a noite tentei escrever aqui...nao saiu nada! É engraçado isso, eu nao escrevo quando quero mas quando posso. E nao é uma questao de disponibilidade de tempo (até é...), mas de disponibilidade de espirito. As vezes até tô a fim de escrever, mas nao sai nada. Nao adianta pressionar. Mas ai hoje de manha, veio. Acho que eu precisava colocar o que eu estou sentindo primeiro em palavras orais para depois transcrever. Ontem peguei o Rudi pra conversar. Acho que ele pensou que ia sair um DR (= discutir a relaçao), mas nada disso. Eu tava precisando falar de mim mesma, e tudo que eu precisava era de alguém pra ouvir. Nesses casos, ninguém é melhor que le. Ele fica ouvindo com uma cara que tu nao sabe se ele ta escutando, e ontem o coitado ainda tava morrendo de sono. De vez enquando eu perguntava: Ta me ouvindo? E ele demorava um pouco pra responder (talvez estivesse meio que dormindo), dizia que sim, comentava alguma coisa e esperava que eu continuasse despejando. Nao é facil ter uma mulher-mala! Mas quando ele abre a boca, o tiro é certeiro. Ontem a conclusao magica dele foi: ' Tu tem que entalhar, My. Como uma escultura. Com o teu coraçao. Faz como tu sabe fazer, com o teu coraçao. É assim que as coisas que tu faz dao certo. Tu nao pode esquecer que pra ti, tudo tem que ter coraçao.' (Vocês vao entender se tiverem saco de ler esse post até o fim).
Bom, começando do começo saimos 10 dias de férias. Que maravilha! Praias, muitas praias. Praias sem milho cozido, caipirinha, peixinho frito. Mas ainda assim, a estrela maior, o mar, estava la. Que falta que eu estava sentindo do barulho do mar, do cheiro do mar, da maresia! Ele, claro, se lavou de surfar. O Pedro aprendeu a surfar de prancha mesmo (de morey ele ja ia), fica em pé e tudo. Filho de peixe. Eu li dois livros me torrando no sol, coisa que mais amo. A Giu se lavou de correr e brincar e ja anda se ensaiando no surfe também. Ficamos em gîtes (B&B) lindos, acampamos, vimos coisas maravilhosas, nos divertimos. Essa é a forma que mais gostamos de gastar a grana (quando se tem alguma, logico), viajando. Passando tempo juntos, vivendo, curtindo. Nao sei por que, mas sempre tive essa coisa com viagens. Talvez tenha sido uma coisa de familia mesmo. Minha mae é a piada da casa por que quando ela tem que pegar um aviao pra qualquer canto. Ela chega no aeroporto com 5 horas de antecedência. Morre de medo de perder a oportunidade de viajar. Além disso, minhas melhores lembranças da infancia foram durante nossas viagens em familia, um tempo onde ficavamos todos juntos. Era engraçado que meu pai de repente tinha uns 5 minutos e queria voltar pra casa correndo. Mas mesmo assim, ficou o gosto de aprender com aquilo que é mais diferente de mim. Viajar nos leva a conhecer os outros, o mundo, mas sobretudo a gente mesmo. Ta, tudo bem...Pode me dizer que a gente pode viajar dentro de casa mesmo, que o importante é mudar a rotina... Li isso em um monte de livros de auto-ajuda. mas pra mim, essa historia de 'viajar em casa' é consolo pra comodismo e falta de grana. Claro, cada um tem seus gostos e prioridades, nao tenho nada a ver com isso. Pode até dar no mesmo pra algumas pessoas, nao pra nos.
A gente começa a viajar planejando, desenhando, imaginando como vai ser. Ai arrumar tudo, malas, brinquedos, seleconar os livros.... tudo é divertido! Pegar a estrada (de carro, onibus, trem ou aviao)...tesao! Sair do 'mundo real' (é real?). Conhecer gente nova, falar outra lingua, comer diferente, beber diferente...aaaaaiiii...eu amo! Ai tem a volta. Eu também adoro voltar, e meio como o meu pai, quando chega o dia eu tenho uns siricuticos. Preciso ir. Da uma ansiedade de voltar, colocar na parede os quadros novos, olhar os e-mails (dessa vez passei 15 dias sem tocar num computador - recorde!), rever as pessoas, arrumar a casa, preparar a vida. Adoro também! Diferente do meu pai, nunca quero voltar antes do fim. So termina quando acaba. Mas quando volto, ai que bom! Dessa vez, na volta fizemos 17 horas one shot. Nao paramos nem pra comer (da-lhe drive-thru). A coisa boa é que as crias sao hiper-acostumadas (ja que sempre tiveram eses pais débeis) e conhecem plano 'orsis on the road': 1) ninguém pode reclamar, 2) mamae e papai também estao de férias, portando: nos poupem!; 3) cada um cuida das suas coisas; 4) paramos pra fazer pipi quando a familia tiver 3 votos a favor, salvo em necesidade extrema; 5) mamae descasca laranjas, maças e tudo que é fruta sem reclamar, mas so depois que entrar na autoroute (se nao eles ja querem sair de casa comendo e em duas hors de viagem o estoque acaba); 6) cada um se vira pra passar o tempo como quiser dentro do carro: ler, desenhar, jogar, olhar a paisagem, ouvir musica, conversar tudo é permitido (so nao vale jogar travesseiros, gritar e enlouquecer) e...7) depois da terceira vez que perguntar ' a gente ja ta quase chegando?' mamae e papai nao sao mais obrigados a responder ( e nao responderao).
Mais ou menos obedecendo essas regrinhas eles vao super na boa. Aprenderam a gostar do lance. Quando chegamos em casa eles ja perguntam pra onde vamos da proxima vez. E o pior é que eu ja volto pensando nisso...hehehe
Valores sao valores. melhor cada um descobrir os seus. Melhor quando a gente compartilha com o marido esses valores...bem melhor! No fundo acho a gente muito louco. Nossos eletrodomésticos foram todos doados (menos o fogao ja que na época nao tinha ninguém se desfazendo do seu). A decoraçao da casa vai lentamente (queremos mesmo é decorar com as coisas que a gente traz das nossas trips). Nao tenho roupas de marcas nem jantamos em grandes restaurantes. Nao damos muita bola pra isso. De vez em quando é bom, mas nao é algo que nos estresse. Nosso negocio é de vez em quando (em bom gauchês): deitar o cabelo!
Pois é, mas voltei. Voltei e meu 'terceiro filho' me esperava ansioso. Antes de sair expliquei pra ele que eu precisava dar um tempo, relaxar, pra poder cuidar melhor dele na volta. Valeu a pena. Meu projeto (lindinho!) tava ali, esperando mamae pra continuar a crescer. Depois de um ano trabalhando nos projetos do meu diretor (muito legais, por sinal), chegou o momento de começar a construir a minha criaçao. Foi pra isso que eu vim aqui. Foi isso que impulsionou toda a nossa mudança de vida. Agora estamos aqui: eu e ele, sozinhos, um frente pro outro...é nois na fita, mano!
É estranho, mas so quem trabalha com ciência (e gosta, bem etendido) pode entender o que é a confecçao de um projeto pessoal. Um projeto é, em algum sentido, uma forma de obra de arte. Nunca fui artista, nunca tive talento pra nada de arte. Mas imagino que deva ser mais ou menos o mesmo tipo de sentimento que une um artista e um cientista. Pelo menos quando o cientista pensa um pouco como o artista. Pra começar é aquela tela branca. Aos poucos o computador vai fcando cheio de arquivos com pedaços da 'obra'. Ao lado do computador, pilhas e pilhas de papéis com os outros pedaços. Tudo é uma questao de paciência de ler, achar o que tem ver (nao é mais ou menos isso que o pintor faz com as suas tintas?). Ler mais, recortar, colar, reescrever, linkar, pensar. Amar e odiar. Tem noites que eu fecho o computador com a sensaçao de dever cumprido, que beleza. No dia seguinte, decepçao. Nao era mais nada disso. No livo que li antes de dormir achei a 'chave', e ...bom...melhor mudar um pouco. E reescreve, refaz, repensa. Oh, Cristo! Tem horas que brigo com ele, digo que é um 'feio'. fecho tudo e me emburro. Shit! Um tempo passa e eu faço as pazes, tenho outras idéias, começo a achar o lindo, lindo de novo. Exatamente como o artista, o cientista também tem seus idolos inspiradores. Um dos meus se chama Shaad Maruna e trabalha atualmente na Irlanda. Ele é a minha principal motivaçao pra falar e escrever em bom inglês. Quando leio o que ele escreve, percebo uma forma de fazer ciência apaixonada e apaixonante, uma esperança la no fundo (nem que seja bem no fundo) de ajudar a mudar um pouquinho o mundo, de melhorar alguma coisinha. Ele me motiva. E ele trabalha bem. No tipo de metodologia de pesquisa que eu uso, nunca vi ninguém como ele. Ele consegue o que eu mais quero: que o meu trabalho final possa, sempre no mais cientifico dos rigores cientificos, falar de sentimento e de paixao. Paixao pelo que a gente ama, pelo projeto que a gente acredita, mesmo! So que querer isso também é colocar a barra mais alta ainda pra mim. Eu bem que podia querer fazer um doutorado basico, ter meu phd atras do nome, achar um emprego legal e bye bye so long. Isso ja é muito, e nao é facil. Mas nao consigo, nao adianta. No Brasil fui convidada pra fazer o doutorado em uma universidade super legal, com um dretor muito competente. Trabalhei um ano com ele, me puxei, produzi, mas eu nao tava feliz. Eu nao podia ter o MEU projeto. Adoro pesquisa de qualquer jeito e acho legal trabalhar com os interesses dos diretores, a gente aprende horrores. Mas mesmo nao tendo um projeto especifico em mente naquele momento, eu sabia que o MEU projeto nao ia nascer ali, nao naquele contexto. Parei tudo, descobri meu diretor aqui e me mandei. Agora sim. Agora ele vem. Pedacinho a pedacinho. Aqui nunca mudamos meu projeto por completo, ele so foi sendo aprimorado, mais gente foi se implicando, se interessando, gostando dele também. Uma de minhas colegas de doutorado me disse que nunca viu ninguém tao motivada por um projeto de doutorado. Nem eu...hehehe Mas é que so agora, eu amadureci o suficiente pra escrever sobre o que eu relamente quero saber, sobre o conhecimento que eu acho, SIM, que pode mudar um pedacinho do mundo. Nao tem ninguém atras de mim me empurrando pra direçoes que eu nao quero ir. Ao contrario. Meu diretor é tao fantastico que nunca me da as soluçoes prontas. Ele faz as criticas, me olha com uma cara de 'pensa ai, minha filha' e me deixa sozinha. Ai eu me arranco os cabelos, falo com um e com outro, leio um e outro, escrevo uma soluçao e vou ver ele. Ele que ja é macaco véio (no bom sentido), me olha com aquela cara de quem ja sabia o que eu ia achar e me pergunta sobre o percursso que eu fiz. Ele me faz compreender que o trajeto pra achar uma resposta pode nos dar muitas outras respostas, idéias, soluçoes. Interessante é que ele é tao simples que, muitas vezes, fica impresionado com o que eu achei, reconhece que nao tinha pensado nisso ...aiaiai nesses momentos o ego da véia aqui passeia la na lua...hehehe Um dia ele escreveu uma carta de recomendaçao pra mim e disse que tinha certeza que em breve eu seria uma 'colega muito querida e reconhecida no nosso meio de pesquisa'. Fiquei uma noite sem dormir!hehehe
Como toda paixao, a paixao pelo trabalho faz a gente sofrer bastante. Nao basta estar bom, tem que ser novo, fantastico, radiante. Pas evident! Reconheço que eu sofro, me ararnco os poucos cabelos que me restam. Mas quando da certo, ou quando vem um reconhecimento qualquer (grande ou pequeno), é bom demais. O dificil é encontrar motivaçao em todas as fases do trabalho, esse é o desafio. Pra mim é isso que faz a diferença. Especialmente nessa fase onde tudo começa a se definir. O maior desafio do momento pra mim é sentar a bunda quieta e ficar sozinha horas a fio. Nem MSN, nem olhadinha nos e-mails, nem telefone (esse fica desligado), e nem pensar na faxina que a casa ta precisando. Eu e ele, ele e eu. Nos conhecendo. O projeto- obra-de-arte. Isso que ele é pra mim. Mais do que nunca eu compreendo aquela velha frase que diz que as boas realizaçoes sao fruto de 1% de inspiraçao e 99% de traspiraçao. Falando nisso, preciso buscar outro copo d'agua.

3 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Quanta dedicação!
...antes de qq coisa o seu doutorado é e, sempre será um projeto de vida.Foi ele que te incentivou a uma " viagem " quem sabe permanente ao Canadá.
Temos novidades: passamos na entrevista! Um alívio pra cabeça...
Sobre viagens, é só o que nós aqui gostamos de fazer!!! é chegando de uma e, planejando outra. Quando nos mudarmos, podemos fazer uns campings com as crianças.
fiquem em paz,
um abc,
Camila

12:49 PM  
Blogger Rossana said...

Pois é Mylène!!
Eu não sei bem o que acontece!! Por que a gente vê muito aqui é uma campanha em massa (por parte do Quebéc principalmente) sobre imigração, e por outro lado li uma reportagem onde a população diz que Quèbec já tem imigrantes demais!!! Vá entender!!

Olha, recebi teu e-mail!! Brigadão pelas dicas!! Respondo depois te enchendo mais um pouquinho hahahaha

beijão

12:12 PM  
Blogger Alexandre said...

Oi Mylène....

Mandei um email pra vc respondendo sobre seu comentário sobre sermos vizinhas,mas o email está voltando, tipo aquelas respostas automáticas...não sei se é só aqui ou se vc não está recebendo emails mais por lá.
Um beijo,
Dani

11:10 AM  

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