Friday, February 15, 2008

Ser como o rio

Entao aqui termina o percurso de "No Québec é diferente". O titulo que escolhi reflete, antes de mais nada, a nossa maior esperança: de que no Québec fosse realmente diferente. Depois de dois anos de trajetoria no hemisfério norte, acho que posso afirmar do fundo do coraçao que, sim... no Québec É MESMO diferente! É diferente e é melhor! Eu acho...beeemmm melhorrrr!!! As vezes penso que a cegonha deve ter errado meu trajeto, sei la. Acho que ela me desouvou no lugar errado. Chegando aqui, desde o inicio como este blog testemunha, me senti em casa. Engraçado! Como se tivesse achado meu canto, minha turma. E esse sentimento so cresce. Ontem eu estava conversando com meu diretor e uma colega perguntava quando eu ia visitar o "chez moi", se referindo obviamente, ao Brasil. Me deu um aperto no peito e eu so repetia " Mais là...chez moi c'est le Québec!". Estranho...eu falava do fundo do coraçao. Acho uma certa hipocrisia alguém sair do seu pais em busca de segurança e qualidade de vida e continuar chamando esse pais de "sua casa, seu lar". A minha casa é onde eu posso viver dignamente e ser feliz. Esse é meu conceito de lar. Mas isso é muito pessoal, e cada um vê de um jeito.
Mas enfim... eu continuo adorando isso aqui. Continuo agradecendo a Deus por tudo, tudo que estamos vivendo. As coisas estao sendo mmmuuiitttooo melhores do que a gente esperava. Eu diria mesmo mmmuuiiitto melhores do que eu, um dia, ousei pedir. Alors, merci Bon Dieu!Nostalgia do Brasil, nao sei se tenho. Na real acho que nao me dou muito o direito de ficar nessa de nostalgia (so vale a do Leite Moça)...heheh Pra frente é que se anda e vamo la.
Acho que, justamente por isso, nesse momento eu tenha decidido que esse blog ja deu mesmo o que tinha que dar. Acho que ele cumpriu a sua maior funçao que era de documentar passo a passo a nossa adaptaçao no novo pais, na nova Patria, na nova vida. Cumpriu. Fico imaginando como vai ser legal quando o Pedro e a Giu forem adultos, trilingues e lindoes (isso eles ja sao...hehe) e pegarem esses escritos para ler. Talvez eles fiquem conhecendo um pouco mais sobre a doida da mae que eles tem...talvez nao. De qualquer maneira, com certeza vao lembrar de momentos, ver fotos, etc.
Talvez eu nao tivesse escrito (quase) regularmente por dois anos se as pessoas queridas que nos acompanham nao tivessem deixado aqui seus comentarios. Cada um desses comentarios encorajadores, sobretudo, fazem parte da nossa vida agora. Cada um foi um presente que recebemos e que vamos guardar com muito carinho. Algumas dessas pessoas eu conheci pessoalmente, algumas sei que ainda vou conhecer. Mas nao todas. Nao sei porquê. Tem gente que me acha fresca. Sou mesmo. Aprendi depois de muita porrada, graças ao nascimento dos meus filhos, a guardar "um pouco" da minha privacidade. Além disso, nao sou consulado nem agente de imigraçao. Conheci quem eu fiquei afim, quem bateu. Sempre ouvi meu coraçao. Às vezes eu acertei, outras errei. Paciência. Ser fiel a seus sentimentos nao nos exclue da possibilidade de errar. É assim, mas no balanço final muito mais acertei que errei e voilà.
Entao aqui fica a marca desses dois anos, mas nao é um fim. Eu adoro pensar em termos de gestalt. É uma gestalt que se fecha, para que outras se abram. É um corte com um momento, com um ciclo. Sempre acreditei que a gente tem que (quando possivel) fechar as gestalts que a gente abre. E a gente também precisa ser como rio. Deixar fluir. Deixar rolar. A gestalt do blog esta sendo fechada e outras estao sendo abertas... como a faxina na casa. As vezes a gente tem que tocar algumas coisas fora para abrir lugar pro novo.
À cada um que torceu, que riu e chorou comigo...um grande merci. À quem quiser manter contato:mypsi2002@yahoo.com.

E termino com Manuel Bandeira:

Ser como o rio que deflui
Silencioso no meio da noite.
Nao temer as trevas da noite.
Se ha estrelas no céu, refeti-las.

E se os céus se pejam de nuvens,
Como o rio as nuvens sao agua;
Refleti-las também sem magoa
Nas profundidades tranquilas.

Saturday, February 02, 2008

Homenagem publica

Tô eu aqui em pleno faxinao...quer dizer, em pausa do faxinao. É que eu tava la esfregando meus armarios das cozinha e ouvindo Nando Reis, quando me deu uma vontade danada de escrever essa mensagem pra uma das pessoas que eu amo mais no mundo: meu chum. É uma mensagem de reconhecimento e agradecimento...uma homenagem.
Quando resolvemos imigrar, eu tava fissurada nas historias de doutorado e foi ele quem fez os primeiros passos para o visto. Ele que pesquisou na internet, que imprimiu formularios, que botou mais pilha ainda. O caso é que nos nunca soubemos muito bem como seria o mercado de trabalho pra profissao dele por aqui. Aparentemente tinha muitas oportunidades, mas percebemos também (como de fato se comprovou chegando aqui), que era um mercado atolado em funçao dos milhares de cursos tipo DEP oferecidos por um monte de escolinhas de todo o tamanho. Assim, cogitamos que seria um mercado bastante saturado. Eu nao sabia muito como ele ia reagir e me lembro de uma noite, depois de uns dois copinhos de cerveja, numa mesa de bar, onde conversamos seriamente sobre o assunto. Eu nao queria ter surpresas chegando aqui. Eu nao queria que ele ficasse infeliz. Eu tava com medo. nao queria largar meu sonho, mas sobretudo nao queria largar ele e nao queria que ele fosse infeliz. Nao queria que ele suportasse a infelicidade so pra me seguir. Desse jeito eu nao queria. Se o preço pra me realizar fosse vê-lo triste, também nao valia a pena. Pois nessa noite ele me tranquilizou e depois deste momento nunca mais tivemos nem um segundo de duvida sobre o que estavamos fazendo.
Ele me lembrou que ha muito tempo nao tava satisfeito com o trabalho dele e que, ha alguns anos, sobretudo depois do nascimento das crianças, ele nao tava muito feliz. O trabalho artistico que ele fazia antes tinha sido em boa parte substitudo por samplers e nao sei mais o que quê, e o metier tinha perdido bastante da graça. Além disso, falou do quanto ele ficava incomodado em nao ter horario fixo de trabalho. Quando a gente nao tem filhos, tudo bem virar duas noites seguidas, dormir dois dias, trabalhar 7 dias por semana por dois meses e depois passar um mês inteirinho no marasmo. Mas quando o pequenos vêem, isso enche um pouco o saco. A gente quer fazer planos, viajar, ficar junto e nao depender 100% do tempo dos contratos que a empresa vai assinar. A gente combinou que, de qualquer jeito, iriamos trabalhar em qualquer coisa no inicio e que a gente nao ia queimar todas as nossas economias fazendo supermercado em dois pra um (dois reais pra um dolar). Combinamos que iamos pra batalha juntos, que se nao desse a gente voltava e que seja o que Deus quiser. Alias, uma coisa que nos acalmava muito quando a gente ouvia falar da vida aqui, ou quando a gente lia na internet é que..aqui...so nao trabalha quem NAO QUER. Isso nos tranquilizava, ja que nao tinhamos medo de trabalhar em qualquer coisa, e estavamos mesmo prevendo que teriamos que fazê-lo. De fato, essa é uma realidade. Quem ta afim de trabalhar, de por a mao nao massa, nao tem problemas em achar um trampo (e nao interessa nem o nivel do francês). Claro que nao vai ser o trampo dos sonhos da criatura, mas pelo menos nao precisa ficar gastando de dois pra um e nao precisa mexer nas suadas economiazinhas. Bom... é assim que a gente pensa, tem quem nao concorde.
Mas tudo isso pra dizer que chegando aqui foi tudo bem como a gente pensou. Estudamos francês, achamos uns trampinhos, eu esperando a resposta do doutorado, ele pesquisando sobre o ramo dele. Depois de quatro meses eu tive a minha resposta positiva e ele..a dele. A dele foi que a area dele aqui é muito parecida com o que é no Brasil. Trabalha por contrato, quanto tem trampo de ferra, quando nao tem, nao tem. Instavel. Atrolhada de gente saindo das escolinhas que ensinam o que ele ja sabe ha uma pa de anos. Pensam que ele se deprimiu? Que nada. De uma forma ou de outra ele tava preparado, foi tocando como deu. Achou um trampo nessa multinacional onde ele ta até hoje. Pensamos que ia ser temporario. Mas voila que ele gostou. A galera era legal, dava pra treinar bastante o francês (alias o dele melhorou muito depois disso), eles oferecem treinamentos, RER, seguro saude. Ele curtiu, ele ficou. Nao vou dizer que fosse o trampo que ele sonhou (e menos ainda a familia dele que arrancou os cabelos no Brasil...hehehh). Mas ele encarou, tocou como deu.
E é por isso que hoje eu faço uma homenagem publica ao homem da minha vida, que é um verdadeiro Homem, com H maiusculo, que é macho pra caramba, como diz a minha mae. É um baita guerreiro! Vejo todo mundo elogiando seus maridos por terem achado empregos nas areas deles (na maior parte informatica), e acho isso muito justo. É muito bom achar emprego na area que a gente trabalhava no Brasil. Especialmente SE a pessoa realmente ama essa profissao. Foi o meu caso. Tiro meu chapéu, parabéns a todos. Mas acho que sao, tanto quanto ou mais admiraveis, as pessoas que sao capazes que avaliar que nao eram felizes em suas areas e recomeçar. Ter humildade pra aprender um outro metier, batalhar, suar (literalmente) a camiseta. Nao é pra qualquer um. Meu marido foi criado pra ser playboy e olha ele aqui.
Nessa empresa que ele ta, o legal é que tem muita chance de progredir, e ele aproveita cada uma. Escrevemos cartas, preenchemos formularios, vamo la. Ele ja mudou duas vezes de cargo. Duas mudanças pra melhor. Mas agora veio a promoçao que ele queria. Nao tô cabendo em mim de alegria. Por que ELE merece. Graças ao BOm Deus, eu ganhei a melhor bolsa de doutorado que o governo do Canada oferece e ainda trabalho na universidade. Se ele quisesse podia virar 'dono de casa'. Ainda mais que nos nao temos la grandes ambiçoes materiais. Nossas ambiçoes tao em outro niver. Mas nao. Ele colocou a cara dele e batalha.
Entao a homenagem é pra ele, e pra todo mundo que como ele, nao estao encostados em ninguém e tao batalhando como podem e com as armas que têm. Gente digna e capaz. Capaz de seguir seu caminho com seus proprios pés e ainda caminhar lado a lado com alguém. Pessoas como eu que, em outros paises, em outras linguas, seguem o caminho que começaram, merecem homenagens, sim. Mas gente como ele, merece muito mais. Entao, meu amor, fique sabendo que eu sou ENORMEMENTE FIÈRE DE TOI!!!! Com promoçao, ou sem promoçao, o verdadeiro GUERREIRO aqui é tu.